O QUE É UMA VENDA JUDICIAL?

Uma venda judicial é um processo legal pelo qual um bem, geralmente imóvel ou outro tipo de propriedade, é vendido através de uma decisão judicial, independentemente da vontade do seu proprietário. Essas vendas ocorrem quando há uma ordem do tribunal para a venda de um bem, a fim de satisfazer uma dívida, cobrir despesas judiciais ou distribuir ativos entre as partes envolvidas em um processo legal.

As vendas judiciais são geralmente realizadas em casos de execução de hipoteca, penhora de bens para pagar dívidas, liquidação de empresas insolventes ou divisão de propriedades em casos de sucessão por morte, divórcio ou disputas legais. O objetivo principal de uma venda judicial é garantir ao credor o direito de ser pago pelo património do devedor. O credor é aquele que propõe uma ação executiva ou que reclama o seu crédito, no âmbito de determinado processo executivo ou de insolvência enquanto o devedor (também designado "executado", "insolvente" ou "requerido") é o proprietário do bem que vai ser vendido através do tribunal. O valor arrecadado na venda é usado para pagar ao credor, mas também para pagar as despesas judiciais e os restantes credores que tenham reclamado o seu crédito. O que sobrar, se valor algum sobrar, será devolvido ao devedor.

Contrariamente ao que acontece numa compra e venda normal, na venda judicial a transmissão da propriedade só ocorre depois de emitido o título de transmissão, após o pagamento do preço e uma vez provado o cumprimento das obrigações fiscais competentes (IMT e Imposto de Selo nas execuções; nas insolvências, quando o insolvente for uma empresa, em regra, existe uma isenção legal de IMT).

Aquisição do bem por um interessado

Os interessados na aquisição no bem poderão adquiri-lo mediante proposta em carta fechada, leilão ou negociação particular. Hoje são mais raras as situações de proposta em carta fechada que eram a regra para as vendas de imóveis já que as vendas judiciais ocorrem sobretudo em ambiente digital mediante leilão eletrónico. No leilão eletrónico, existe um valor base, um valor de abertura e um valor de mínimo.
O valor base é o que é fixado pelo orgão executivo depois de ouvidas as partes. Corresponde a uma ponderação entre o valor patrimonial tributário efetuada há menos de seis anos e o valor de mercado do bem, no caso dos imóveis, ou só valor de mercado nos restantes casos. O valor de abertura é metade do valor base. O valor minino é igual a 85% do valor base do bem.

O bem em causa não é vendido se nenhuma proposta for igual ou superior ao valor mínimo. Se isso ocorrer, a venda passa a negociação particular. Nesta modalidade, o bem poderá ser adjudicado mesmo que o valor mais elevado de licitação seja inferior ao valor mínimo. Mas, para o efeito, é necessário que não ocorra oposição do exequente, executado e que juíz concorde. 

Aquisição do bem pelo credor

Nos processos de execução [v. sobre venda executiva aqui], o credor poderá adquirir o bem penhorado. Tem ao seu alcance duas possibilidades para o fazer: mediante proposta (em carta fechada, leilão ou negociação particular) nos mesmos termos que os restantes interessados ou mediante requerimento de adjudicação.
Na venda mediante proposta em carta fechada o credor poderá, tal como qualquer interessado, entregar, dentro do prazo estabelecido, um envelope com respectiva proposta na secretaria do tribunal, podendo beneficiar do regime de dispensa de depósito.
A par da modalidade de venda mediante propostas em carta fechada, existe a possibilidade de adjudicação pelo próprio credor. A distinção entre aquisição por proposta em carta fechada e adjudicação, é feita pela qualidade do adquirente dos bens penhorados. Enquanto na proposta por carta fechada qualquer proponente pode adquirir o bem, na adjudicação, apenas podem adquirir o exequente ou um credor reclamante.

Anulação da venda

Em determinadas circunstâncias a venda poderá ser anulada a pedido de algum interessado.
Os fundamentos podem consistir no exercício do direito de remição, direito de preferência ou na omissão de formalidades essenciais.

Direito de remição
Quanto ao direito de remição, este define-se por ser um direito de preferência qualificado. É uma preferência legal de formação processual que tem por finalidade a proteção do património familiar, evitando a saída dos bens "familiares" da família do executado.
Mediante o exercício do direito de remição, o cônjuge, descendente ou ascendente do executado têm, sem dependência de qualquer notificação, o direito de adquirir os bens adjudicados ou vendidos pelo preço oferecido por qualquer proponente.
O exercício do direito de remição é, no entanto, limitado temporalmente: só poderá ser exercido até ser proferido o despacho de adjudicação de bens.

Direito de preferência
Já o exercício do direito de preferência, pode ter lugar mesmo depois da adjudicação do bem ao adquirente, colocando em causa a aquisição do bem, mesmo que já tenha sido registado. Existem três tipos de preferências: as legais, as convencionais com eficácia real e as convencionais com eficácia meramente obrigacional.

Apenas as preferências legais e reais são suscetíveis de serem oponíveis à execução. Exemplo de uma preferência convencional dotada de eficácia real é a existência de um contrato promessa de compra e venda com eficácia real. Exemplo de uma preferência legal é a existência de um arrendatário do prédio urbano, do comproprietário, ou do proprietário do prédio rústico confinante ou serviente. Mas é importante que conste do registo, de outro modo poderá ser desconsiderada.

O dever de notificar os preferentes determina que a sua omissão ou frustração lhes permita a possibilidade de avançar com uma ação de preferência. Tal significa que a aquisição feita por adjudicação ou por venda pode ser impugnada por ação de preferência proposta no prazo de 6 meses sobre a data do conhecimento dos elementos essenciais daquela alienação executiva.

O direito do exequente/credor estará no entanto assegurado na medida em que é requisito da ação de preferência o depósito prévio do preço e das despesas da compra. Caso o preferente vença a ação de preferência, substituir-se-á ao exequente/credor, sendo a este pago o valor que despendeu. Ou seja, o exequente perderá o bem, mas ser-lhe-á pago o valor por que o adquiriu.

Omissão de formalidades essenciais
A venda poderá ser anulada com fundamento em ações ou omissões do agente de execução que se mostrem essenciais à transparência da venda. Uma dessas situações, e a mais comum, é a omissão de notificação dos preferentes ou omissão de publicidade do ato.

O papel do agente de execução nos processos de execução comum

Nas ações executivas, a competência para a prática dos atos relativos à venda executiva pertence ao agente de execução. Entre outras, neste âmbito, são as seguintes as suas funções:
  • escolher a modalidade de venda;
  • fixar o valor base dos bens a vender e fixar lotes deles;
  • publicitar a venda;
  • notificar os preferentes, os executados, o exequente e os credores reclamantes;
  • lavrar o auto de abertura e aceitação de propostas;
  • adjudicar bens ao proponente ou preferente;
  • liquidar a responsabilidade do proponente ou preferente que não deposite o preço;
  • comunicar a venda dos bens ao conservador do registo predial competente e  comunicar a extinção da execução.

Quem pode estar presente no ato da venda


Na venda executiva existem regras próprias para a abertura, licitação, sorteio, e aceitação das propostas. A fiscalização do cumprimento dessas regras pressupõe a presença no ato por parte dos interessados. Por isso, o direito de assistência é conferido ao exequente, executado, reclamantes com garantia sobre os bens a vender e a todos os proponentes. O direito assistência, porém, perdeu alguma importância com a existência dos leilões online, por onde passa atualmente a generalidade das vendas judiciais.

Em suma, uma venda judicial é um processo complexo e moroso com intervientes processuais com interesses opostos, tornando-se difícil dar indicações precisas sobre o tempo que demora a concluir e o seu desfecho.