QUEM RESPONDE PELAS DÍVIDAS DO CASAL?

Cada cônjuge é responsável pelas suas próprias dívidas individuais. No entanto, existem algumas situações em que os cônjuges podem ser responsabilizados conjuntamente por dívidas contraídas durante o casamento. Tudo depende do regime de bens do casamento, que determina se os bens são próprios ou comuns, e se a dívida é considerada como sendo comum ou própria.

Regime de bens do casamento

Existem três regimes possíveis:

Regime da separação de bens
É regime que procura sobretudo evitar equívocos entre os cônjuges e que em algumas circunstâncias ou para alguns é um regime obrigatório. Estão nesta última situação daqueles que se casam como mais de 60 anos de idade ou, em determinadas circunstâncias, os sobreendividados.

Regime da comunhão geral de bens
É o regime oposto ao regime da separação de bens. Neste regime, tudo, ou quase tudo, passa a constituir propriedade de ambos.

Regime da comunhão de adquiridos
É o regime jurídico em que são comuns os bens adquiridos depois do casamento e são próprios, os bens que cada um leva para o casamento. Uma vez que é o único regime de bens que não pressupõe a ida prévia a um cartório notarial a fim de celebrar uma convenção antenupcial acaba por ser actualmente o regime de bens da generalidade dos casais. 

Tendencialmente, se os cônjuges estiverem casados sob o regime de separação de bens, cada um será responsável apenas pelas suas próprias dívidas, não havendo responsabilidade conjunta. Pelo contrário, na comunhão geral de bens, os cônjuges também podem ser responsáveis pelas dívidas contraídas por qualquer um deles durante o casamento, mesmo que sejam dívidas individuais.

Dívidas comuns e dívidas próprias

Há que ter ainda em conta a finalidade da dívida e se aproveitam à comunhão ou apenas a um só. 

No orçamento familiar, como no orçamento de uma empresa, o valor do ativo comum é aumentado com o valor da receita e é diminuído com o valor da despesa. O saldo será positivo quando o valor da receita for superior ao valor da despesa e negativo quando ocorrer o inverso. A realidade, porém, é complexa, rica e variada. A despesa pode, na verdade, representar investimento e a receita pode, sem surpresa, revelar-se uma fonte de despesas. 

De um modo ou de outro, a despesa é sempre problemática. Neste tema da despesa, quando à autoria, as despesas podem ser efetuadas por apenas um dos cônjuges ou por ambos e, independentemente disso, beneficiar ou prejudicar um ou ambos. Existem pois duas questões que o direito tem que dar resposta: a primeira é a de saber o que se consideram dívidas comuns; a segunda, se, pelo cumprimento dessas obrigações, responde o património comum ou o património próprio.

Dívidas comuns
As despesas contraídas por ambos não oferecem problemas, são comuns.
 Mas consideram-se comuns também as despesas contraídas por um só, independentemente de terem sido consentidas pelo outro, sempre que esteja em causa qualquer uma das seguintes situações:
  • sirvam para dar cobertura aos encargos normais da vida familiar (alimentação, vestuário, saúde ou farmácia);
  • aproveitem ao casal, desde que nos limites dos poderes de administração (viagens ou festas);
  • sejam realizadas no exercício do comércio;
  • onerem doações, heranças ou legados quando os respetivos bens tenham ingressado no património comum ou;
  • onerem bens comuns.
Para essas dívidas consideradas comuns vigora o regime da solidariedade. Isso significa que respondem, em primeiro lugar, os bens comuns do casal devedor e, em segundo lugar, os bens próprios de qualquer dos cônjuges. 

Mas, atenção, o bem comum não se presume! Uma dívida, ainda que contraída por um só e em proveito comum do casal (administração ordinária), responsabilizará ambos os cônjuges apenas se o credor conseguir alegar e provar o proveito comum do casal.

Dívidas próprias
A lei considera dívidas próprias as que tenham origem em factos criminosos, factos imputáveis a um dos cônjuges (indemnizações, restituições, custas judiciais ou multas) e as que onerem apenas bens próprios.

Nas dívidas próprias ou não comunicáveis, a solidariedade funciona ao contrário: primeiro, respondem os bens próprios daquele que as produziu e, depois, os bens comuns do casal, a menos que este último requeira a separação judicial de bens.

Penhora dos bens comuns do casal

Quando não há pagamento voluntário das dívidas, comuns ou próprias, a garantia do credor concretiza-se com a penhora dos bens do devedor.

Até 1995, o credor dificilmente conseguiria executar os bens comuns do casal porque o legislador privilegiava o interesse da família sobre o interesse do credor, que via assim os seus créditos frustrados. O casamento funcionava assim como um abrigo seguro contra os credores. Mas esta realidade foi alterada em 1995.
 
Após 1995, passou a ser possível que os bens comuns respondessem, a título principal, pela dívida de ambos ou, a título subsidiário, pela dívida própria de um dos cônjuges. É claro que fazer pagar o cônjuge inocente pela dívida própria do outro cônjuge é violento. Então, para evitar esta injustiça penalizadora, ficou previsto que a solidariedade pudesse ser relativizada nos seus efeitos. Ou seja, sendo penhorados os bens comuns, o cônjuge “inocente” tem a possibilidade de se defender, requerendo a separação judicial dos bens. Passa a responder então pela dívida apenas a parte (meação) no património comum daquele que a originou. Na prática, a separação de bens faz operar uma partilha de bens que altera o regime da comunhão para o da separação. Acionado este mecanismo de defesa, o credor só se poderá pagar pelos bens (da meação) adjudicados ao cônjuge devedor. Convém esclarecer que a separação judicial de bens não tem o mesmo significado que o divórcio (separação de pessoas e bens). Contrariamente ao que acontece no divórcio, na separação judicial de bens os cônjuges continuam a comungar de todos os direitos e deveres inerentes ao casamento.

É importante ressaltar que este artigo é apenas uma visão geral e simplificada da questão. As questões relacionadas à responsabilidade pelas dívidas dos cônjuges podem ser complexas e variam dependendo de cada situação específica. Em casos mais complexos, é aconselhável procurar aconselhamento jurídico específico.